30 de dezembro de 2022

segredo

 


(Mario Howat)

você me bagunça os sentidos: ao te olhar sinto cheiro de mar, seu abraço tem gosto doce e suas palavras são de todas as cores.
você me enche o coração enquanto o estômago parece carregar todo o peso da saudade que vem sendo engolida a seco à medida que o pulmão abriga as borboletas que me fazem cócegas na alma voando em sintonia com o disparo dos flashes das memórias que sonho em viver com você.
seus olhos me abraçam, seu toque faz meu corpo dançar, sua boca mata minha sede - e me causa fome de você. quanto mais você, parece que mais fome - como se você me tornasse, de certa forma, infinita. um poço sem fundo, cheio de tudo de bom que existe para se sentir. seu fogo me molha e sua água me queima
você me faz navegar com a segurança de um píer, como se nenhum mar pudesse me abalar… e me percorre com a suavidade de uma balsa, ainda que mergulhe fundo como um submarino (que seria amarelo, pra inundar meu coração-oceano como a música faz ao tocar).
você é a adrenalina de um cafuné na cama com a tranquilidade de um backflip em alta velocidade num dia de chuva. você é a exceção que confirma todas minhas regras e a regra que eu mais gosto de quebrar; um sorriso molhado de lágrima e um choro com soluço de gargalhada.
sua existência é um grão de areia do tamanho do universo e um multiverso todinho que se concentra no tempo-espaço do aqui-e-agora (o tempo todo). você é a realização de todos os impossíveis inimagináveis, como se a gravidade pudesse ser responsável por me permitir respirar de ponta-cabeça submersa em água e nadar no ar na velocidade da luz.
você é o som do silêncio, a cor da escuridão, a tradução do indizível, uma notícia importantíssima deixada em segredo e um segredo dividido por todo e qualquer ser que já existiu. você é o ponto de encontro perfeito para se perder e a perdição que é exatamente o lugar certo, sempre..
você é o amor. e o amor é (o segredo de) tudo.

24 de maio de 2018

Sobre cafés e você

                                          (John-Mark Smith)

(dá play aqui antes de começar a ler)

O café (com leite) que eu esqueci de tomar deixou na minha boca o gosto dos beijos que eu deixei de entregar. Mas eu tomei mesmo assim - pra lembrar de não deixar acontecer mais e não desperdiçar (nem o café e nem os beijos).



Já o pão de queijo - trazido de Minas Gerais e recém saído do forno - trouxe o cheiro do abraço com nuances de saudade. Saudade boa, daquelas que a gente mata que nem mata fome: com grandes porções (de amor, principalmente).

Na hora do almoço o ronco do estômago fazia coro com o coração - ambos com o mesmo buraco e algo faltando naquele momento. Pra sossegar um, café. Pro outro...

Na dúvida (ou na falta) dos ingredientes necessários, aceitei batata grande por mais um real e troquei a bebida por milkshake.
Sobrevivi até a janta porque o café da tarde esquentou o coração. Tava doce como os beijos que eu não perdi e ao cruzar com meus próprios olhos no espelho vi que eles sorriam comigo. Sorri ainda mais.

Antes de dormir, uns tragos de estragos: até a fumaça ocupa um espaço enquanto dança na minha frente. E dança no ritmo da música que toca na minha cabeça. Aquela, sabe? Aquela que percorre o corpo como o arrepio que vem depois de uma mordida.

Pra acabar o dia, deixo preparado o filtro com o pó na cafeteira pra amanhã já começar bem. Pra hoje espero dormir bem e ter bons sonhos, porque a verdade sobre cafés e você é que dá pra passar o dia sem, mas é bem melhor quando tem. O café eu arrumei e quem sabe assim - pelo menos em sonho - você vem.

25 de agosto de 2016

Desculpa a bagunça...




Desculpa o mau jeito, desculpa a bagunça... Mas a roupa no chão foi você que jogou. Foi só chegar perto e me despiu com os olhos, e me vi nua diante de você.
Não... Não é como se fosse um desejo fatal, daquele que arde só de se ver, e então na sua cabeça eu estava me insinuando... É que você me faz baixar a guarda e me desarma, você despe a alma. Fico sem a proteção das minhas armaduras.
Você me olha e me enxerga. Você, ao me ver, me lê. Não precisou de muito, não, foi mais fácil do que pude notar... Não tive nem tempo de tentar me proteger.
Mas aí você cuida, né. Me bota no colo, me encosta no teu peito, me abraça com jeito pra me dar teu calor e aquece meu coração.
Desculpa chegar assim do nada, sem nem bater na porta ou tocar a campainha. Eu não queria te invadir, mas é que você entrou em mim e fez morada. Tem algo de você em mim que me faz fazer parte de tu... Porque diz um amigo meu que amor não é posse, é pertencer. De certa forma, te pertenço.
E não é como se fosse sua, de fato, não sou, nem sei se jamais seria. Mas tem parte de você em mim, e eu já to morando em você. Ninguém mandou me abrigar, sabe? Sou espaçosa, você já notou.
E bagunceira, também. Uma tragédia.

Mas é que você me fez sentir bem. Confortável. É um calor agradável que exala em você.
Às vezes quente demais que até queima, mas é que pele com pele gera atrito, mesmo... Mas quente mesmo é o coração. E mais quentes que os beijos são os abraços, e foi nesses abraços que resolvi me aninhar.

O problema do ninho é que passarinho voa, não é por maldade. Tem que bater as asas e cantar a liberdade. Só não esquece que o ninho é o refúgio que abriga, então é teu calor que eu volto a procurar.
Porque você consegue fazer meu coração borbulhar. E transbordar.
Uma, duas, três vezes... E continuo contando.

Construí o ninho em você e fiz do teu colo um porto-seguro, deixei-me te amar e chamei de lar.
Outros pássaros vão encontrar o encanto do refúgio que tu é, e em meus voos sei que me perderei.

Mas o lar é onde a gente ta bem, nada muda o que a gente tem.

Não posso deixar de te agradecer, embora saiba que digo muito isso... Obrigada pela nudez e por compensa-la com abrigo quente.

Não vai embora sem aviso - e, de preferência, nunca avise pra não ter que ir. E se for, vai na paz e cuida com carinho de tudo o que te dei, afinal, meu corpo qualquer um pode despir, mas a alma foi proeza sua. Só não quero perder o abrigo e ficar sem armadura.

17 de maio de 2016

(é) leve [-me (com você)]



Ela foi tão leve
E me deixou tão leve
Que senti meu coração elevar.

Ela foi tão leve
E me deixou tão leve
Que minha alma podia voar.

E eu que sempre fui âncora, me senti peixe em alto mar.
E eu que sempre fui raiz, me senti pluma pairando no ar.

Queria te contar:
É leve com você.
Quando chegar perto,
Eleve-me com você.
E se for sair não me esqueça…
E leve-me com você.

23 de novembro de 2015

#nãopoetizeomachismo








Perante seu falo eu não me calo.
Não engulo seu discurso de macho cantando de galo.
Guardem suas asinhas e protejam seus pintinhos,
Melhor baixar a crista e ficar bem pianinho.

-
A primavera das mulheres trouxe um bando de passarinho
As minas tão voando alto, cansaram de se esconder no ninho.
Agora vai escutar a gente cantar alto, noite e dia.
E vocês vão ver cada uma surgir das cinzas, tipo fênix: rainhas!



- para saber mais: Nãopoetizeomachismo

9 de setembro de 2015

Branco, vermelho e preto


Não sou guarani-kaiowá
Tenho terra firme e tenho casa pra morar.
Minha pele não é vermelha, é branca.
Mas das minhas mãos escorre tanto sangue que nem se enfaixar estanca.
Um sangue que eu não derrubei, mas desde sempre é obra dos meus "iguais".
Uma parcela dessa gente tão branca (mas tão suja) que acha que sempre precisa (e pode) ter mais.
Entre uma vida e uma cerca, escolhe o arame farpado,
E, pra garantir seu reinado, se esconde atrás de um bando fardado.
Não sou tupi, não sou xingu, yanomami, não sou guarani nenhum, eu sei.
Mas não só pela síria, também pelos nativos da minha terra eu chorei.
A guerra "não declarada" no Brasil é contra qualquer um que tenha cor - até os que trazem o arco-íris.
E o branco, que era pra ser paz, na verdade é sinônimo de terror - pros outros, pros mesmos é sinal de serem livres.
Enquanto o vermelho e o preto, associados a sangue e escuridão, só tem direito à terra se for debaixo do chão (isso quando tem, já que na maior parte das vezes não tem, não).
Até quando os fantasmas de navios negreiros ainda vão se materializar de tantos jeitos?
Até quando quem veio de fora vai matar quem construiu esse país com as próprias mãos e tirar todos seus direitos?
Até quando toda essa gente direita vai disfarçar os desvios de conduta com um papo torto de que só estão indo à luta?
Luta é coisa justa, se luta de igual pra igual.
Receio que não seja o caso quando só um dos lados tem todas as armas e todo o capital.
Muda, Brasil.
E para de ser mudo.
A pátria mãe gentil por todos seus filhos entra de luto.
É muito fácil fazer barulho e depois fingir que está surdo.
Eu ouço os gritos e as chicotadas,
Eu ouço os tiros e pessoas assassinadas.
O meu luto, hoje, é vermelho, assim como é a minha luta. Vermelho da pele e vermelho do sangue que hoje cobrem tanto chão verde dessa terra filha da puta*.
(*Entende-se por "puta":
Mulher forte e resistente usada para satisfazer os outros ganhando em troca só exploração.
Mulher de quem tiram tudo e só devolvem destruição.
E qualquer semelhança com o que fazemos com o mundo é mera especulação!)

14 de setembro de 2014

Sinestesia



O cheiro doce é quase macio, entra nos pulmões como se acarinhasse; como as mãos que deslizam pelos fios de cabelo.Já a pele, salgada. Da brisa do mar, do suor, sei lá... Contrasta com a doçura, mas acompanha a maciez.
Maciez também nos olhos que, embora difíceis de decifrar, guardam claramente o carinho do sorriso; sorriso sereno, bonito, que emana luz e um calor próprio - talvez por ser emoldurado pelos lábios que já foram provados... Quentes.
E o calor dura, segue, insiste. Na pele, de fora pra dentro; no peito, de dentro pra fora.
Do lado de fora pássaros cantam em suas gaiolas um canto de socorro querendo sair. Do lado de dentro pássaros dançam em sua mente ao som de um canto que encanta, querendo entrar.
E de olhos fechados não tem sal, calor, nem som. O cheiro ainda é doce e macio, entra nos pulmões como se acarinhasse e rouba sorrisos como se fizesse cócegas.

10 de setembro de 2014

Se tiver a Vida nos braços, abrace forte.


  O meu corpo, antes mole, agora se contraía o máximo que era possível e eu sentia, além de muito frio, todos meus músculos doerem. Tremendo, meu calor se esvaía e meus pés quase saíam do chão com tanto movimento. Não consegui pedir socorro, mas ele veio. Ela veio. Mãe sempre sabe. 
  Minha boca, roxa. O banheiro todo embaçado de vapor. E a pele estava pálida e arrepiada como se o chuveiro soltasse granizo. Sentia dor, mas não podia falar. Após a tentativa de me aquecer por fora, a morte continuava a vir de dentro, já tinha se alojado em mim. 
  Uma vez no quarto, tentei fazer a vida me invadir. Afinal, ela estava mesmo bem ali sob meus olhos, a minha Vida. A Vida que eu botei no mundo, minha paz na vida. Lutei, mesmo sem força. Com a morte dentro e a vida fora... Tentei lutar. 
  Quando tudo apagou, já não tinha mais dor. O frio existia, mas o medo já era quase amigável: "Como vai a Vida?" - vai bem, obrigada, dedico a ela tudo o que tenho. E morrer, agora, não seria perder a vida, mas me doar a ela, e por ela, até a morte é aceita. 
  Aos poucos abri os olhos e pisquei de novo e quando vi ainda era vida. Pisquei de novo e era noite. Som de choro por todo lado, mas a Vida continuava em paz. Uma voz familiar ecoava "...morrendo..!!!" e outra, mais familiar ainda, chorava desesperada até soluçar. Mãe sempre sabe. 
  Respirei fundo e, já sem dor, sorri. "Vida" - eu disse, baixinho, e pude ver seu sorriso de volta pra mim. Pisquei de novo e quando abri os olhos era dia. Um novo choro, parecia música. E minhas lágrimas aqueciam o que antes fora hipotermia. 
  Depois de horas de morte fria de dentro pra fora, com um abraço quente comecei a sentir o alívio de fora pra dentro. Mais uma vez em meus braços: Vida. E eu, viva. 
 

30 de agosto de 2014

Eu-você-nós



Entrelaçamos as mãos e enlaçamos pernas e braços em abraços até dar nó.

Quanto mais nós, melhor.


Nos enroscamos em laços fortes, amassos, nos deixando o mais perto que puder.

Porque quanto mais nós, melhor.  


Já o coração, afrouxou, laceou, não se aperta mais.  

E justamente por isso... quanto mais nós, melhor.


Não tem mais nó na garganta, só no cabelo - preso com um lacinho pra não enroscar. 

Mas mesmo assim, quando mais nós, melhor.


Porque nem todos nós apertam, nós que nos apertamos.

E quanto mais nós, melhor. 

26 de agosto de 2014

novos versos aumentando o mundo

O Livro "versos para aumentar o mundo", de Victor Rodrigues, tem uma página em branco antes de cada poeminha, com a idéia de que quem o adquire aumente os versos do poeta com seus próprios versos.
Particularmente, eu amo esse livro e brincar com seus poemas é um exercício que me inspira e, por isso, uma das minhas metas de 2014 é terminar o livro todo. Até lá, compartilho aos poucos com vocês.

Quando você compra o livro, o lindo do Victor daz uns versinhos aumentando o primeiro poema especialmente pra você.

O meu foi:
"Pra quem sabe ser menor
senta com os pequenos
tem sempre nas mãos
o tamanho do mundo."



para Fer Oliveira:

Nesse mundo tão cheio de nós,
nos enchemos de laços,
pra não perder o contato
mas ainda sobrar espaço.
(página 8)


Amigo é onde nosso coração mora,
não precisa pagar nada,
é só partir pro (l)a(r)braço
(página 12)


Marmita Poética
                                                                                 para Victor Rodrigues

Sou 100% fome, mas não do que se come
o que me sacia eu devoro com os olhos
e guardo dentro do coração.
(página 18)


Acostumou-se tanto com a frieza
que passou a chorar granizo.
(página 26)


peço a Paulo que não me
apresse
faço minha prece pra seguir
São.
(página 32)


Não martele minha mente
com suas pregações.
Minha fé é grande demais
pra ficar presa em pregos.
(página 46) 


A justiça farda
é só falha.
(página 52)


Pra quem quiser entrar na brincadeira, entra em contato na página Praga de Poeta. Custa 5 dinheiros (mais o frete, caso peça por correio). E se quer um conselho, já aproveita e pede outros 2 livros do moço, não vai ter arrependimento, garanto.